domingo, 20 de março de 2016

A minha Paulista

A minha Paulista tinha só duas faixas.
A minha Paulista tinha casarões e jardins.
A minha Paulista tinha um Trianon sem grades.
A minha Paulista não tinha ciclovias, mas eu andava de bicicleta sem medo.
A minha Paulista era só uma avenida que atravessava para ir ao colégio.
Envelheci sem plásticas, mas a minha Paulista não. Foi sendo "plastificada". Sumiram os casarões e os jardins e em seus lugares cresceram grades e alarmes adubados pelo tal do poderio econômico do qual a Paulista virou um triste ícone. Grades reais e simbólicas de separação, de distanciamento. O "E" sumiu, o "Ou" impera. Eu ou você. 
Hoje a Paulista é o palco do "Ou" ! O palco onde se combate uma guerra entre dois exércitos de " Walking deads" ! Mortos porque não pensam. Mortos porque movidos pelo ódio que os faz defenderem suas frágeis posições que não resistiriam ao mais leve raio de pensamento. Ocupadíssimos em um cabo de guerra. O mais esperto fica com o butim da guerra. E por algum tempo vão se alimentar de despojos, rindo como hienas. Até que sobrevenha nova guerra, porque nada mudou. Mudança só com muito esforço, humildade e coragem para enfrentarmos o mal maior que iguala exércitos: a COBIÇA, a ganância, o "Ou". 
Sou bem velha, mas ainda não perdi a esperança no "Nós" ! 

sábado, 12 de março de 2016

Sozinho?

Noite após noite, pedacinho a pedacinho, a colcha vai sendo tecida. Ela tem um destino muito especial. A importância desse destinatário faz com que ela coloque em seu trabalho um capricho e um cuidado especiais. A maciez da lã é essencial, na combinação das cores buscou a harmonia perfeita. Tecendo e pensando naquele que iria receber o presente. Será que ele gostaria? Iria sentir-se aconchegado com ela? Por quanto tempo a colcha permaneceria com ele? De quantos sonhos dele ela seria testemunha?
Foram muitas noites e muitos pensamentos. Quando finalmente deu por encerrado o trabalho, olhando criteriosamente para avaliar o resultado de sua dedicação, percebeu que tramado junto com cada ponto havia além dos fios coloridos todos os pensamentos que dedicará ao destinatário. Afinal tecera uma colcha de crochê e sonhos.
Entregou-o finalmente. Esperava algum retorno, mas jamais poderia imaginar o que receberia.
Na manhã seguinte, o toque do telefone e aquela vozinha tão querida.
- Vó, a colcha tem teu cheiro, então já posso dormir sozinho !