domingo, 29 de novembro de 2015

Determinações finais

Assim como não deleguei à vida autoridades sobre minha mente não delegarei à morte decisões sobre meu corpo. Quero que ele seja transformado em cinza e espargido à beira mar da praia que amo. Prazeirosamente acompanharei o movimento das ondas até o final dos tempos. 

Nossa vã filosofia

A falta é o tempero do encontro e a felicidade mora apertadinha entre uma e outro. Temer a dor da falta acaba com o binômio e a felicidade perde sua morada.

domingo, 22 de novembro de 2015

Portas e Janelas

Dentre tantos modelos à disposição, desde as mais singelas até as mais suntuosas, prefiro as portas abertas. Aquelas em que para anunciarmos nossa chegada batemos palmas e iniciamos um diálogo:
- Ó de casa!
- Quem vem lá?
Se a porta está aberta supomos que somos bem vindos ao mundo de quem está do outro lado.
A bem da verdade não é bem uma porta, é mais uma passagem entre o mundo de fora e o de dentro, em qualquer sentido que se queira tomar fora e dentro. Ao atravessarmos esse umbral encontraremos  água fresca de moringa de barro, chão de vermelhão tão encerado que até brilha, cortinas branquinhas e transparentes, samambaias que se alimentam de carinho e de cuidado, doce de mamão verde e de cidra, relógio que marca um tempo que não tem medida, não é hoje nem ontem, é sempre.
Janelas tem uma vantagem sobre as portas: não ficam ao rés do chão. Estão mais distantes do real e mais perto do sonho. Delas também só gosto das abertas e quanto mais amplas melhor. Sonhos precisam de espaço para bater as asas. Se cortinas houver que sejam branquinhas e transparentes, só para modular a luz. Do lado de lá das janelas nunca se sabe o que se vai encontrar. Para sonhar é necessário abrir mão das expectativas, lançar-se no vazio e permitir que o que estiver do outro lado acione nosso reservatório de sonhos. Outras janelas onde se vislumbre sombras, um abajur aceso, uma mesa posta ( para quantas pessoas? ), um tapete puído, ou cortinas tão pesadas que quase são paredes. O que vejo é o que é ou é o que sonho? 
Para mim o que sonho é o que é.

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Homenagem ao silêncio

O que seria da música se não fossem as pausas. O que seria das emoções se não fosse o silêncio. Deixo, para quem tiver chegado até aquí, meu silêncio para que cada um o preencha com suas emoções.

domingo, 8 de novembro de 2015

Iconoclasta

Em nossa cultura tupiniquim, para ser considerada uma pessoa culta é fundamental que tenhamos lido Euclides da Cunha, James Joyce, que adoremos Clarice Lispector, que veneremos Bach e por aí vai. Caso me falte algum dos requisitos acima ou que ouse tecer alguma crítica serei considerada menos esclarecida, invejosa e que com essa mente pequena jamais alcançarei tais grandezas. Será que me salvo se tiver lido a Divina Comédia em italiano? Só que gostei mais do livro do Inferno. Acho que é porque lá é o lugar dos invejosos.
Para completar minha condenação vou estender a lista. Elis Regina, Cazuza, Renato Russo, Freud...
O problema para mim é que ídolos tendem à universalidade e a eternidade, certamente muito mais por culpa de seus cultuadores do que por eles mesmos. Todos tiveram seus bons e seus maus momentos, suas genialidades e suas mediocridades. Mesmo essas genialidades dependem do tempo e do espaço em que manifestaram, mas para os idólatras qualquer gesto deles é majestático. Nas mídias divulga-se que Freud gostava de cachorros. O morador de rua que dorme embaixo da marquise também. Será que o cachorro gostava de Freud? Aí sim ele subiria no meu conceito.
Acho que só me resta voltar para a Divina Comédia....


segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Complexo de Deus

Realmente o ser humano é único na natureza. Não tenho conhecimento de nenhuma espécie que se vanglorie de suas mazelas e que se utilize de todos os meios para divulgá-las. Provavelmente porque não as acredite mazelas mas virtudes. Interfere arrogantemente onde lhe aprouver. "Afinal o que é bom para mim certamente é bom para todos." 
Imagens divulgadas em redes virtuais:
Uma árvore impedida de atingir seu desenvolvimento normal é exibida como arte. 
Um fogoso cavalo é domesticado a ponto de anular sua natureza e obedecer à sua sorridente e orgulhosa cavaleira e mergulhar de um trampolim.
Cães vestidos como pessoas ou travestidos de acordo com as fantasias de seus donos.
Uma grande arara azul deitada como um bebê em um colo amoroso. "Áfinal se bebês gostam de colo, araras também tem que gostar!"
"Tudo tem que ser feito à minha imagem e semelhnça,"