Ai que pena! Ninguém nunca brincou com elas. Jazem congeladinhas em seus esquifes de papelão. Aprisionadas na espera de alguém que desarrumasse seus cabelos, que fizesse novos penteados despenteados, que trocasse suas roupinhas por outras que nem seriam tão perfeitas, mas seriam muito mais macias. Nessa espera, elas perdem a confiança em seus sorrisos. Afinal eles não foram capazes de conquistar ninguém. Suas bochechinhas são as partes mais endurecidas pelo descaso.
Dói mais saber que nem sempre foram assim.
Era uma vez uma boneca, de longos cabelos negros e lisos. Fora presenteada a uma menina carrancuda, que, sabe-se lá porquê, não se encantou pela boneca. Deixou-a em um canto do quarto e às vezes, muito às vezes, tirava o pó da caixa. Nessas ocasiões a boneca tentava captar-lhe o olhar, caprichava no sorriso. Em vão. Foram tantas tentativas frustradas que a boneca entristeceu.
Muito tempo depois, essa boneca "em perfeito estado de conservação" foi presenteada a outra menina. É, de fato, o corpinho estava perfeito, mas a alminha....
Essa nova dona apaixonou-se pela boneca. Logo quis brincar. Tirou da caixa, trocou a roupinha, fez trancinhas e foi dormir feliz.
Na manhã seguinte lá estava a boneca dentro da caixa, com suas roupas engomadas e os cabelos escorridos. A menina imaginou que tivesse sonhado de brincar e brincou tudo de novo. Em vão. A boneca não sabia brincar. Por algum tempo a menina entristeceu. Depois, porque tivesse o vício da felicidade, a menina guardou a boneca em um lugar quentinho do coração, aceitou o fato de que ela, coitadinha, não sabia mais brincar, e foi pela vida brincando de escrever histórias de bonecas.
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